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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR - RADIOIMUNOENSAIO - GERADOR DE TECNÉCIO - CIRURGIA RADIOGUIADA


Prof. Dr. João Eduardo Irion
Faculdade de Medicina
Universidade Federal de Santa Maria – RS – BR
Médico Nuclear
Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria
jirion @terra.com.br
joaoeduirion.blogspot.com.br


RADIOIMUNOENSAIO

O radioimunoensaio praticamente surgiu com o aparecimento da imagem e com ele, além da terapêutica e da clínica, as provas laboratoriais in vitro passaram a integrar a Medicina Nuclear.
Em 1950 a física Rosalyn Sussman Yalow e o médico Salomon A. Berson começaram a trabalhar no Laboratório de Medicina Nuclear no Veteram Administration Hospital, em Nova Iorque, no Bronx. O objetivo do trabalho era determinar, por meio de radioisótopos, o volume sanguíneo, fazer o diagnóstico clínico das doenças da tireóide, estudar a cinética do iodo e a distribuição da globina dos pacientes hospitalizados. Nessa ocasião, o Dr. I. Arthur Misky levantou a hipótese de que o diabete melito não era devido à deficiência de eliminação do hormônio pelo pâncreas, mas podia ter como causa a rápida degradação da insulina pela insulinase hepática. Para confirmar a hipótese, Yalow e Berson começaram a estudar o metabolismo da insulina com injeções intravenosas de insulina marcada com I-131 em um grupo de pacientes diabéticos e outro grupo de controle composto de pessoas não-diabéticas.

                     
                                           Ilustração 1 - Rosalyn Sussman Yalow

O resultado mostrou que a insulina desaparecia mais lentamente do plasma de pacientes previamente tratados com insulina exógena (tanto para o diabete como para terapia com choque insulínico em esquizofrênicos) do que do plasma dos pacientes que nunca foram tratados com o hormônio. Com essa constatação, eles concluíram que a lentidão no ritmo de desaparecimento da insulina era devido à ligação do hormônio marcado com um anticorpo que aparecera como resposta à administração prévia do hormônio. Nessa época não existiam técnicas laboratoriais com sensibilidade suficiente para detectar anticorpos em baixíssimas concentrações e, por isso, os dois pesquisadores começaram a desenvolver um método para medir a quantidade do complexo antígeno-anticorpo por meio de radioisótopos.
Nos nove anos seguintes, os dois pesquisadores trabalharam no desenvolvimento da técnica que, concluída, passou a se chamar Radioimunoensaio (abreviadamente RIA) acrômio da expressão em inglês radioimunoassay. De início, foi usado I-131, mas depois  o I-125, porque esse último isótopo do iodo é emissor de radiação γ de baixa energia, mais adequada para ser medida em detectores de poço.
O método tornou-se capaz de medir concentrações de proteínas no plasma entre 10-40 a 10-12 M. Por sua alta sensibilidade e alta especificidade RIA revolucionou a endocrinologia no diagnóstico de doenças causadas por excesso ou deficiência de hormônios e, além disso, foi contribuição fundamental para o entendimento da fisiologia hormonal em geral, regulação da secreção hormonal, mecanismos de liberação dos hormônios e outros fenômenos biológicos.
Os trabalhos de Rosalyn Sussman Yalow e de Salomon A. Berson foram concluídos em 1959, quando tentaram publicar os resultados, mas duas revistas especializadas recusaram o trabalho da comunicação dos achados, porque o método contrariava os conhecimentos dos endocrinologistas e imunologistas da época que não acreditavam que os peptídeos se comportavam como antígenos. A justiça veio mais tarde e, pela importância revolucionária do radioimunoensaio, Yalow e Berson (esse já falecido) receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina de 1977.
RIA não é uma técnica específica e limitada para o sistema imunológico. Ela pode ser usada em outros sistemas nos quais, no lugar do anticorpo específico. há um reagente a uma substância de ligação especifica.
As aplicações do RIA podem ser assim sistematizadas: 1) - medida de hormônios peptídeos – hormônios da pituitária,  hormônios coriônicos, hormônios pancreáticos, hormônios calcitrópícos, hormônios gastrointestinais, hormônios dos tecidos vasoativos,  outros; 2) – medida de hormônios não-peptídeos - hormônios tireóideos, esteróides , prostaglandinas e aminas biológicas; 3) medidas de substâncias não hormonais – drogas e vitaminas, nucleotídeos cíclicos, enzimas, vírus, antígenos tumorais, soroproteinas e outros.
Em 1964, a Amersham começou a vender os primeiros kits para radiouminoensaio da insulina marcados com I-125.
Embora RIA seja uma técnica extremamente sensível e específica, os bioquímicos procuram não usar substâncias radioativas em seus laboratórios ou são impedidos de fazê-lo por falta de qualificação para trabalhar com radionuclideos. Dessa forma o RIA começou a ser substituído por reações com ligação de enzimas imunoabsorventes (ELISA), que usam medidas colorimétricas por fluorescência no lugar da radioatividade. Em muitos países do mundo ocidental, essa técnica fez RIA desaparecer.

O GERADOR DE TECNÉCIO

O tecnécio não tem isótopos estáveis e por isso é muito raro encontrá-lo na natureza. Esse nuclídeo foi descoberto por Carlo Edmond Perrier e por Emilio Segré na Itália em 1937, quando analisaram uma amostra de molibdênio que fora bombardeada com deutério no cíclotron de Berkeley. O nome tecnécio foi dado ao nuclídeo por Segré um ano depois da descoberta, aceitando a sugestão de um colega grego que informou que a palavra “technetos” significa artificial em grego, perfeitamente justificada pela forma de produção artificial do nuclídeo.
A ideia de construir geradores conhecidos como “vacas” (cows) cabe a Warren E. Winsche, um engenheiro químico que trabalhou no Oak Ridge National Laboratory e depois em Brookhaven. Ele partiu do princípio de que é possível obter-se isótopos de meia-vida curta (filhos) a partir de um nuclídeo de meia-vida longa (pai). Os geradores permitiram o uso em Medicina Nuclear de nuclídeos de meia-vida curta em lugares distantes do local de produção.
Em 1958, Walter Tucker e Louis G. Stang,
 chefe da Hot laboratory Division  construíram o gerador telúrio-132/iodo-132 (esse com meia-vida de 2 horas e 28 minutos). O problema do gerador era a contaminação de pequenas quantidades de telúrio no eluato de iodo-132 porque era injetado contaminado com telúrio, fato que os pacientes reclamavam porque a contaminação produzia um forte hálito de alho. Esse problema foi resolvido com o uso de uma coluna de óxido de alumínio no gerador com a qual se obteve um produto puro.

                                     
                                              Ilustração 2 - Walter Tucker e Louis G. Stang.

Tucker e Margaret Greene (a química do Hot Laboratório) encontraram outra impureza no gerador telúrio-132/iodo-132 e nesse caso foi a presença do 99mTc, constatando que esse nuclídeo provinha de um elemento “pai”, o 99Mo. Partindo da semelhança entre o par telúrio-iodo com o par molibdênio-tecnécio, os dois pesquisadores criaram o primeiro gerador de tecnécio usando também o óxido de alumínio para purificar o eluato.
Tucker disse: “O isótopo é perfeito, tem uma só radiação γ, não tem radiação β e tem meia-vida de seis horas. A gama câmera está chegando o tecnécio tem um nível de energia ideal para a câmera de cintilação”.
Powell Richards, chefe da produção de radioisótopos do laboratório, percebeu o potencial do tecnécio na Medicina Nuclear e apresentou um trabalho sugerindo seu uso como traçador no 7th International Eletronic and Nuclear Symposium em Roma, em junho de 1960. Nesse ano, no The Society of Nuclear Medicine1s Southwestern Capter Meeting, foi apresentado o tema “Radioisotopic Cows” sobre o gerador de tecnécio. Esse trabalho foi publicado no primeiro exemplar do Journal of Nuclear Medicin de 1960.
No voo de volta de Roma Richard encontrou Paul Harper da University of Chicago e do Argone Cancer Research Hospital. Durante a viagem, Richard falou para Harper do gerador e das qualidades do tecnécio. No ano seguinte, Harper encomendou do Brookhaven National Laboratory o primeiro gerador de tecnécio com a intenção de usar o novo radionuclídeo para medir fluxo sanguíneo de pacientes. Foi pesquisando fluxo sanguíneo que Harper constatou a captação rápida do traçador pela tireóide e por tumores cerebrais. Essas descobertas despertaram o interesse dos médicos nucleares sobre o uso do tecnécio como radiotraçador, estimulados pela facilidade de obtenção de geradores, pela meia-vida curta, pela baixa irradiação dos pacientes e pela emissão pura de γ cuja energia é adequadamente baixa para ser usado com a câmera de cintilação.
Foi assim que as propriedades do técnécio (melhores do que as qualidades do iodo-131) o tornaram radiomarcador de eleição, dando origem à Segunda Fase do uso de radiofármacos em Medicina Nuclear, a Fase Pós-tecnécio.
O grupo de Richard criou o colóide de enxofre marcado com Tc, o pertectenato, o kit para marcação do ácido dietilenotriaminopentacético (DTPA) e o kit para marcação de glóbulos vermelhos. Na reunião anual de  Berkeley de 1964 ele promoveu  primeira reunião do Clube do Tecnécio.
Em 1966, o BNL tornou-se de incapaz produzir e distribuir os geradores de tecnécio para atender a crescente demanda e transferiu a produção e distribuição para o setor privado comercial. O primeiro gerador comercial foi vendido pela Nuclear Consultants, Inc. de St. Louis (mais tarde incorporada pela Mallinckrodt) e pela Union Carbide Nuclear Corporation de Nova Iorque.

CIRURGIA RADIOGUIADA

A ideia da cirurgia radioguiada, fundamentada no acúmulo de um radiotraçador em tecido anormal e localizado por meio de um detector não é recente. A primeira cirurgia desse tipo foi realizada por Selverstone e sua equipe da Harvard Medical School de Boston em 1949, após injetar no paciente fósforo-32 (emissor de radiação β), para localizar um tumor cerebral por meio de um detector Geiger-Müller. Eles usaram essa técnica numa série de 33 pacientes
William H. Sweet usou um detector Geiger-Müller de apenas 2 mm de diâmetro para localizar tumores cerebrais em pacientes nos quais também injetou fósforo-32. Ele comunicou os resultados no trabalho “The use of nucler desintegation in the diagnosis and treatment of brain tumors”, publicado no The New England Journal of Medicine de dezembro de 1951.
O primeiro relato do uso de uma sonda ou detector específico para radiação gama foi feito por Harris e sua equipe do Oak Ridge Institute of Nuclear Studies Medical Hospital em 1956. Nesse caso, a cirurgia foi realizada para localizar resto de tecidos tireóideos após tireoidectomia e depois da administração de I-131.
Em 1981, já na era tecnécio, Harvey do Presbiterian Hospital of Dallas foi o primeiro a usar uma sonda detectora de radiação γ e a injeção de 99mTc MDP para realizar biópsia radioguiada de lesões ósseas benignas e para biópsias de metástases em ossos.
Em 1984, Aitken do The Ohio State University em Columbus realizou uma cirurgia radioguiada de câncer coloretal usando I-131, marcando anticorpo monoclonal. Nesse mesmo ano, Ubhi do Queen’s Medical Center University Hospital de Nottingham, Inglaterra usou cloreto de tálio-201 em cirurgia radioguiada de adenoma de paratireóide. Três anos depois, em 1987, Sickle-Santonello da The Ohio State University em Columbus usou pela primeira vez de anticorpo monoclonal anti-TAG-72 marcado com 1-125.
A primeira comunicação de localização de nódulo sentinela em cirurgia radioguiada de câncer de mama ocorreu em 1993, no trabalho de Krag da The University of Vermont em Burlington que usou colóide marcado com Tc-99m. No mesmo ano, Alex, da mesma universidade, fez pela primeira vez a localização de nódulo sentinela usando colóide marcado com Tc-99m em cirurgia de melanoma.
O primeiro a comunicar o uso e MIBI marcado com  Tc-99m para detectar adenomas ou hiperplasias de paratireóide foi Martinez da The Ohio Satate University em Columbus, no ano de 1995.
Em 1997, Norman e Chheda da University of South Florida em Tampa usou MIBI marcado com Tc-99m para tratamento cirúrgico de hiperparatireoidismo primário.
Em 1999, Desai da The Ohio State University de Columbus usou pela primeira vez 18F-FDG em cirurgia de câncer coloretal.

A EVOLUÇÃO DAS SONDAS PARA CIRURGIAS RADIOGUIADAS

As sondas para cirurgia radioguiada compreenderam detectores gasosos, detectores com cristais e detectores com semicondutores.
É presumível que o primeiro detector Geiger-Muller especialmente construído para uso em cirurgia radioguiada tenha sido o usado por William H. Sweet em 1951
O primeiro relato do uso de uma sonda ou detector gama foi feito por Harris e sua equipe do Oak Ridge Institute of Nuclear Studies Medical Hospital em 1956.
A partir de 1994, foram criadas sondas dedicadas à detecção de radiação + β e, no ano 2000, RR Raylman sugeriu a criação de sondas de ação dupla, isto é, para detecção de radiação + β ou γ, conforme a necessidade.
Todas as sondas descritas dão informações sonoras ou, num painel digital, dão informações luminosas. A sondas que informam por meio de imagens chegam após a invenção das câmeras de cintilação portáteis, logo foram batizadas como o nome de “imaging probes” ou “sondas de imagens”. Francesco Scopinaro e Alessandro Soluri apresentaram a primeira “imaging probe” no Mediterranean Congress of Nuclear Medicine “Radonuclides for Lynph Nodes” em Chipre em 1996. Essa câmera foi patenteada em 1997.

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