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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

IV - A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR – OS DETECTORES NA FASE DE 1896 A 1936

OS DETECTORES EXISTENTES ENTRE 1896 E 1936
Prof. Dr. João Eduardo Irion
Faculdade de Medicina
Universidade Federal de Santa Maria – RS – BR
Médico Nuclear
Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria
jirion @terra.com.br
joaoeduirion.blogspot.com.br

AS CHAPAS FOTOGRÁFICAS

Quando foram descobertos os raios X e a radioatividade, não existia um equipamento de detecção específico para detectar ou medir esses dois fenômenos. A descoberta de Roentgen e, a seguir, a descoberta de Becquerel fundamentaram-se nos efeitos das radiações sobre chapas fotográficos.
Joseph John Thomson, em 27 de janeiro de 1896, foi o primeiro a constatar que os raios X ionizavam o ar e, logo em seguida, na sua segunda comunicação em 9 de março desse mesmo ano, Roentgen também relatou essa propriedade da nova radiação.

O ELETROSCÓPIO DE FOLHAS DE OURO

Depois da descoberta dos raios urânicos, Becquerel e Lord Kelvin constataram que também esses raios ionizavam o ar. Esses dois pesquisadores utilizaram em suas pesquisas o eletroscópio de folhas de ouro. Esse aparelho tem uma longa história que inicia em 1600 com o eletroscópio mais antigo denominado “versorioum” que figurou no livro “De Magnet” de Giolbert, um dos pioneiros na pesquisa da eletricidade. Coube a Abraham Bennet na Philosofical Transcritions da Royal Society de Londres, a em 1785 a invenção do eletroscópio de folhas de ouro que logo em seguida foi aperfeiçoado por William Hasledine Pepys.






                                                           ELetrocópio de folha  ouro

                                      
                         Retrato de Abraham Bennet (por artista desconhecido)

O eletrocópio de folhas de ouro foi o primeiro instrumento usado para detectar a ionização produzida pelos raios x, α, β, e γ. Ele tinha a vantagem de ser um instrumento portátil que não necessitava de uma fonte elétrica de alimentação e várias vezes foi usado para localizar agulhas de rádio roubadas, perdidas ou postas acidentalmente no lixo. Há duas histórias sobre a utilidade do eletroscópio nesses tipos de buscas que podem ser lidas no texto “Tales From de Atomic Age de Paul W. Frame no site: mesmo em 1932, depois da invenção do contador Geiger-Müller,usava-se o eletroscópio de folhas de ouro.William G. Myers em 1982, na sua entrevista para a jornalista Sally .S.  Hughes relata que media amostras de fósforo-32 para que usava na tese, por meio de um eletroscópio, dizendo que uma fonte radioativa forte descarregava o aparelho rapidamente e as fontes fracas o faziam lentamente.

O ELETÔMETRO DE PIERRE E JACQUES CURIE
                                                     
 
                                                        Eletrômetro dos irmãos Curie
Madame Curie optou nas suas pesquisas por avaliar as radiações emitidas pelo urânio, tório, polônio e rádio por meio do eletrômetro inventado pelos irmãos Pierre e Jacques Curie quinze anos antes, portanto, não era um instrumento específico para detectar ou medir a radioatividade e que foi adaptado por Pierre para esse fim.

O ESPINTARISCÓPIO

O primeiro detector diretamente relacionado com a radioatividade foi o espintariscópio inventado, por acaso, por Crookes em 1903. Certo dia Crookes derramou uma amostra de rádio e ao tentar recuperá-la constatou centelhas causadas pelo impacto das partículas α numa lâmina de sulfeto de zinco. Foi assim que construiu um aparelho formado por um tubo fechado numa das extremidades por uma tela de sulfeto de zinco e equipado na outra extremidade com uma lente para detectar partículas α emitidas pelo rádio. O impacto da partícula na tela produzia cintilações e o operador, por meio da lente observava-as e as contava uma a uma.

DO ESPINTARISCÓPIO AO DETECTOR GEIGER-MÜLLER

                     
                                                  Uma versão atual do espintariscópio
Foi usando um sistema semelhante criado por Hans Geiger que Rutherfor utilizou para estudar o resultado do bombardeio de uma fina lâmina de ouro com partículas α emitidas pelo polônio. O uso do dispositivo era tedioso exigindo uma operação que só começava depois que o operador adaptasse seus olhos à escuridão pelo menos por 30 minutos. Além disso, era um trabalho cansativo e sujeito a erros, pois o operador devia usar um microscópio para contar uma a uma as centelhas na tela fluorescente.

O CONTADOR GEIGER-MÜLLER

Para evitar os inconvenientes e os erros inerentes a esse tipo de observação Hans Johannes Wilhelm Geiger começou a estudar o assunto. Em 1911, ele e Rutherford foram coinventores do predecessor do detector Geiger cuja sensibilidade permitia somente a detecção de partículas α. O detector consistia num cilindro metálico (o eletródio positivo) contendo ar com baixa pressão e uma haste metálica central (o eletródio negativo). A passagem de uma partícula α causava uma avalanche de íons produzindo uma corrente entre os eletródios.
                           
                                         Esquema do contador Geiger-Müller
Em 1928, Geiger e seu aluno Walther Müller aperfeiçoaram o aparelho. A partir daí o detector passou a ser conhecido como detector Geiger-Müller e se tornou o equipamento portátil de detecção mais comumente usado. Em 1947, o físico americano Sidney H. Liebson usou halogênio no detector, permitido que ele passasse a trabalhar com menor tensão e aumentando seu tempo de vida. Esse aperfeiçoamento está na versão atual do detector.

A CÂMERA DE WILSON

Em 1880, o engenheiro escocês John Aitken produziu pequenas nuvens numa câmera fechada e com vapor d’água usando um método que foi sugerido na França por Coulier and Mascart. Aitken constatou que as nuvens se formam somente se o ar contiver poeira porque os grãos de pó agem como núcleo de condenação do vapor de água para formar gotículas de água.
Em 1894, o físico e meteorologista de Cavendish, Charles Thomson Rees Wilson  (Prêmio Nobel de Física de 1927), começou pesquisar a formação de nuvens, usando o método de Aitken. Wilson montou uma câmera de expansão de ar, que passou  a ser conhecida como Câmera de Wilson ou câmera de nuvens e fez uma descoberta inesperada: mesmo quando com o ar da câmara livre de poeira, quando a expansão superava 1,25 do volume, apareciam gotículas causadas pela condensação, ainda que a experiência fosse repetida muitas vezes. Esse fato levou Wilson a concluir que a condensação do vapor estava ocorrendo porque uma fonte inesgotável repunha um tipo desconhecido de núcleos invisíveis de condensação.
Wilson atribuiu a formação das gotículas tendo como núcleo partículas ou íons eletricamente carregados que podiam existir no ar mesmo depois de filtrado para eliminar os grãos de pó. Para testar essa idéia, Wilson expôs o ar da câmara de nuvens aos raios X. A câmara passou a mostrar, com a presença de raios X, uma densa nuvem de gotas formando um verdadeiro nevoeiro
Em 1897, Wilson fez experiências com a radiação do urânio e verificou os mesmos efeitos produzidos pelos raios X. Ele sugeriu que nesse tipo de exposição os núcleos de condensação eram íons livres cuja carga estimulava a formação de gotas. Para provar que os núcleos de condensação eram íons carregados, Wilson submeteu a câmera a um campo elétrico o qual, mesmo com pequena intensidade, eliminava rapidamente os íons formados.
Wilson demonstrou que o ar normal está permanentemente com discreta ionização e pensou que essa ionização era uma propriedade do ar. Só depois de 1922, Hess mostrou que a carga no ar atmosférico era causada pelos raios cósmicos oriundos de fora de nossa atmosfera.
Em 1910, Wilson decidiu usar a câmera para documentar os traçados das partículas ionizadas em movimento. Uma partícula ionizada deixa um traço de íons na sua passagem, formando gotículas que mostram sua trajetória. Wilson construiu uma nova câmera na primavera de 1911 e apresentou as primeiras fotografias à Royal Society. A seguir, Wilson modificou a câmera para que funcionasse sem que houvesse turbulência de ar no seu interior para evitar distorções nos traçados. Ele protegeu a câmera por meio de um campo elétrico externo para eliminar toda a ionização do ar pelo que, hoje sabemos, é causada pelos raios cósmicos e, assim, fotografou somente os traçados na trajetória das radiações estudadas. Essa câmera fotografava íons formados num tempo de um quadragésimo de segundo depois da passagem do íon. Com essa câmera foram estudados as trajetórias das radiações alfa (que forma linhas retas espessas), beta (que forma linha retas finas), gama e X (que formam nuvens compostas por trajetos irregulares).
                                    

                                                      Esquema da Câmera de Wilson

Wilson descreveu a nova câmera para Royal Society em 1912. A nova câmera de nuvens é, em resumo, um cilindro de vidro com 16,5 cm de diâmetro e 3,4 cm de profundidade. Suas paredes são revestidas com gelatina, com a base pintada de preto para fornecer um fundo negro para as fotografias. O assoalho da câmera é fixado ao topo de um êmbolo de latão, que pode deslizar livremente no interior de um cilindro externo, também de latão. Em tudo isso, encontra-se uma fina camada de água para manter o ar saturado com vapor.
  
Câmera Gama no Museu de Cavendish
Rutherford referiu-se à câmera de nuvens como “the most original and wonderful instrument in scientific history”.
Como veremos mais adiante nessa exposição, a câmera de Wilson foi o primeiro instrumento usado para a medida da radioatividade aplicada a um ser humano na experiência realizada em 1925 por Hermann L. Blumgart.
Em associação com Wilson, as câmeras de nuvens passaram a ser fabricadas comercialmente pela The Cambridge Scientific Instruments Company e permaneceram como o principal detector nos estudos dos traçados de trajetória de partículas e raios γ e até a invenção das câmara de bolha em 1950.

Postagens anteriores:

 

 

HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNÓSTICO MÉDICO –

ONDAS DE CHOQUE - RUÍDO E SOM - PERCUSSÃO E AUSCULTA.

HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNOSTICO MÉDICO = ONDAS DE CHOQUE - PULSO E PRESSÃO ARTERIAL.

HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNÓSTICO MÉDICO – ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO = RAIOS X

HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNÓSTICO MÉDICO – ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO

A HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNÓSTICO MÉDICO - AS PRIMEIRAS RADIOGRAFIAS, A CHEGADA DOS RAIOS X NO BRASIL - OS RAIOS X NAS GUERRAS - A HISTÓRIA DA EVOLUÇÃO DOS TUBOS DE RAIOS X - A HISTÓRIA DA FLUOROSCOPIA - A HISTÓRIA DA ABREUGRAFIA

A HISTÓRIA DOS FILMES RADIOGRÁFICOS

A HISTÓRIA DOS ÉCRANS REFORÇADORES

A HISTÓRIA DO DIAFRAGMA POTTER-BUCKY

A HISTÓRIA DOS MEIOS DE CONTRASTE EM RADIOLOGIA

A HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA CONVENCIONAL – A HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA

 MEDICINA NUCLEAR – PRIMEIRA PARTE = INTRODUÇÃO = CLASSIFICAÇÕES DOS ELEMENTOS= CLASSIFICAÇÕES DOS NUCLÍDEOS

A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR – A DESCOBERTA DA RADIOATIVIDADE = BECQUEREL = MARIE E PIERRE CURIE 

A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR– A NATUREZA DAS RADIAÇÕES α, β e γ

 

Próxima postagem:

A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR– O CONCEITO DE RADIOTRAÇADOR


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