Prof. Dr.
João Eduardo Irion
Faculdade de
Medicina
Universidade
Federal de Santa Maria – RS – BR
Médico
Nuclear
Serviço de
Medicina Nuclear de Santa Maria
jirion
@terra.com.br
joaoeduirion.blogspot.com.br
A CLÍNICA
Na história da Medicina Nuclear que
estamos narrando consideramos como terceira fase o período de evolução da
especialidade compreendido entre 1950 e os dias atuais. Nas postagens
anteriores, vimos que a especialidade começou com a terapia, e veremos a seguir
como ela ampliou seu espectro de atuação para o diagnóstico clínico, para o
diagnóstico laboratorial e para a cirurgia.
Cinco décadas depois da descoberta da
radioatividade, a especialidade começou a usar os radiotraçadores na clínica
com procedimento classificados como de “não-imagem”.
As primeiras tentativas de usar traçadores com fins diagnóstico foram feitas
medindo a radioatividade fora do corpo e oriunda de nuclídeos administrados aos
pacientes com contadores Geiger-Müller, depois substituídos pela sondas de
cintilação,.
Nos meados dos anos 40, começaram as tentativas de usar o iodo-131 para
diagnosticar os nódulos de tireóide por meio de medidas externas. O método de
medida foi criado por Bauer e consistia, depois da administração endovenosa de
200 mCi de 131 I, em posteriormente, medir com um contador
Geiger-Müller ponto a ponto, orientada por uma grade com 400 posições de
contagem, a radioatividade sobre a tireóide. O processo durava hora e meia, era
trabalhoso e cansativo para o operador e para o
paciente. Outro inconveniente do procedimento era a alta dose de iodo radioativo
necessária, razão pela qual o método só era usado em pacientes portadores de
câncer tireóideo.
Benedict Cassem da Universidade da Califórnia
em Los Angeles melhorou o sistema, criando um equipamento mecânico capaz
de realizar medidas automáticas e aumentou a sensibilidade do detector
substituindo o contador G-M por contador eletrônico, composto de um cristal de
tungstato de cálcio conectado a um tubo fotomultiplicador IP21, blindados com
um colimador de chumbo de um canal.
A sonda (assim definido o detector e seu
colimador) usada por Benedict Cassen e sua equipe tinha maior eficiência para a
radiação γ do I-131 e maior resolução que os contadores G-M e com ela, na primeira experiência, foi facilmente
localizada a tireóide de um coelho no qual fora injetado 10 μCi de I-131.
Benedict Cassem aumentou a sensibilidade do
método, usando um tipo novo e mais aperfeiçoado de válvula fotomultiplicadora,
conectada com um cristal de antraceno, que tornou possível medir a captação do
iodo na tireóide em 6 e 24 horas depois da administração de apenas 1μ de I-131
A partir daí começaram as experiências em
humanos realizadas no Los Angeles Veterans Admnistration Hospital para
localizar a tireóide, medir seu tamanho e o grau de captação do iodo radioativo
no órgão como um todo e nos nódulos tireóideos.
O
CINTILÓGRAFO LINEAR E A IMAGEM EM MEDICINA NUCLEAR
Para evitar os inconvenientes do processo
manual de medida, Benedict Cassen e Lawrence Curtis da Universidade da
Califórnia automatizaram as medidas com a criação do primeiro cintilógrafo
linear, capaz de gerar a imagem da distribuição do iodo radioativo da tireóide
e, posteriormente, a imagem de outros órgãos, usando iodo e ou outros
radionuclídeos.
A invenção do cintilógrafo linear por
Benedict Cassem foi o evento revolucionário que ampliou o campo de ação da
Medicina Nuclear trazendo para ela as imagens, não apenas do tipo anatômico
macroscópico, mas expressando também a função na dimensão molecular.
As imagens geradas pelo aparelho receberam o
nome de cintilografias para relacioná-las com as cintilações ocorridas no
cristal do detector e o equipamento passou a ser chamado, inicialmente, de
cintilógrafo e, mais tarde, de cintilógrafo linear para distingui-lo da câmera
de cintilação.
O primeiro cintilógrafo compunha-se de três
partes. A primeira parte era o sistema detector, formado por um cristal de
tungstato de cálcio de pequeno diâmetro conectado a uma válvula
fotomultiplicadora, ambos protegidos por um colimador cilíndrico, de paredes de
chumbo com um só canal e que era reto.
O segundo componente era o sistema de registro
do tipo eletromecânico de percussão, composto de uma bobina de núcleo móvel
para acionar a percussão de um estilete (de 3 mm de largura) sobre uma fita com
tinta negra, imprimindo marcas em um papel.
O terceiro componente era um motor que movia,
simultaneamente, o sistema de detecção e o papel, ambos unidos ao motor por um
braço. O motor fazia o conjunto detector-papel executar um novo tipo de
movimento que foi chamado “de movimento
de varredura” cujo passo era igual à largura do estilete. O detector varria
a área a examinar no paciente e o papel deslocava-se sob o sistema de
inscrição. Note-se que, nesse primeiro modelo, o papel era quem se movia
enquanto o sistema de inscrição permanecia parado. Os cintilógrafos das
gerações seguintes foram modificados e neles o sistema de detecção e o sistema
de inscrição passaram a se mover unidos pelo mesmo braço, enquanto agora era o
papel que permanecia estático.
Em 1950, Benedict Cassen e Lawrence Curtis
apresentaram o primeiro relatório sobre a invenção do cintilógrafo linear à
Universidade da Califórnia. Logo a seguir a revista “Nature” publicou um artigo sobre o novo aparelho e o ilustrou com a
primeira cintilografia da tireóide de um ser humano.
O primeiro cintilógrafo funcionou tão bem que
permaneceu em uso por três anos e meio no Los Angeles Veteran
Adminisstration Hospital.
Ilustração 1 - Benedict Cassen
Mais tarde outras pessoas, além de Cassen,
reivindicaram a precedência da invenção do cintilógrafo linear, entre eles
Corbertt e Honour que, em 1951, usaram um aparelho com um tubo G-M focado, e
Mayneord e Newbery que, em 1952, criaram um sistema de gravação de imagem
usando um detector G-M.
Ilustração 2 - Cintilografia linear da tireóide com nódulo frio na face lateral do corpo do lobo direito - Imagem do Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria.
No ano de 1950, Lawrence Curtis e Clifton Reed
deixaram seus empregos na Universidade da Califórnia para fundar a R. C.
Scientifc Instrumentes, a primeira empresa que fabricou cintilógrafos com o
nome comercial de “Scintinscanner”.
Ilustração 2 - Cintilografia linear da tireóide de um caso de bócio multinodular - Imagem do Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria.
Ilustração 2 - Cintilografia linear da tireóide de um caso de bócio multinodular - Imagem do Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria.
Logo começou o aperfeiçoamento do cintilógrafo
linear e a primeira modificação consistiu na troca da blindagem de chumbo por
blindagem de tungstênio.
Embora soubesse que os cristais de iodeto
de sódio eram mais sensíveis aos raios γ do iodo-131 do que os cristais de
tungstato de cálcio, Cassem não os utilizou porque cristais selados de iodeto
de sódio de grande diâmetro não eram fabricados na época, e os últimos foram incorporados aos cintilógrafos a partir
de 1951, depois que a Linde Air Products Co. iniciou sua fabricação.
Ilustração 2 - Cintilografia linear da tireóide para controle pós tireoidectomia mostrando restos de tecido tireoideo e adenopatia cervical à direita - Imagem do Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria.
Ilustração 2 - Cintilografia linear da tireóide para controle pós tireoidectomia mostrando restos de tecido tireoideo e adenopatia cervical à direita - Imagem do Serviço de Medicina Nuclear de Santa Maria.
Em 1952, o Professor Robert Newell projetou
para uso no equipamento um colimador multicanal (que foi usinado em tungstênio
por Francis et al.). O colimador multicanal e os cristais mais sensíveis e de
maior tamanho aumentaram a sensibilidade do aparelho, permitindo redução das
doses de radiofármacos utilizados. A melhor qualidade das imagens e a redução
do tempo de varredura consagraram o cintilógrafo como ferramenta para o
diagnóstico.
Em 1953, David Kuhl criou um sistema para o
cintilógrafo registrar imagens em filme radiográfico, usando, para esse fim,
uma fonte de luz colimada e modulada. O dispositivo luminoso eliminou os
inconvenientes da inércia dos sistemas eletromecânicos de gravação. A partir da
invenção de Kuhl, os cintilógrafos passaram a ser fabricados com os dois
sistemas de registros de imagens, o fotográfico e o mecânico.
Em 1963, J. R Mallard e G. J Hine, trabalhando
de forma independente um do outro, criaram a cintilografia em cores. O novo
sistema, funcionando em paralelo com o circuito eletromecânico de gravação,
usava um segundo circuito eletromecânico para modular a cor das marcas
impressas por meio de uma fita colorida,. Nele as variações de concentração do
radioisótopo correspondiam às cores, num gradiente iniciado na cor vermelha
(para a maior intensidade da radioatividade), passando na escala do laranja,
verde, azul, cinza e negro (para essa última cor expressar a menor intensidade
da radioatividade).
Em 1953, Gordon L. Brownell e Willian H. Sweet
do Massachusetts General Hospital criaram um cintilógrafo para localizar
tumores cerebrais com isótopos emissores de pósitrons. O protótipo do aparelho usava dois
detectores eletrônicos de cintilação em posições opostas, montados sobre uma
plataforma móvel. Esse aparelho foi usado para examinar pacientes com tumores
cerebrais nos quais era administrado arsênico-74. A cabeça do paciente era
colocada entre os detectores e o aparelho movia-se para registrar a
distribuição regional do radiotraçador. Os resultados impressos eram chamados
de “positroneletroencefalogramas” ou
“assimetrogamagramas”. O sistema foi usado entre 1953 a 1962, em mais de 3.500 pacientes, porém a qualidade baixa das imagens, a alta dose de
radiação imposta aos pacientes e a dificuldade de obtenção do arsênico-74
prejudicaram a aceitação do aparelho.
Ilustração 2 – “positroneletroencefalogramas” ou “assimetrogamagramas
Em 1957, a invenção da câmera de cintilação fez
prever que os cintilógrafos mecânicos tornar-se-iam obsoletos, mas. mesmo
assim, eles foram usados nos vinte anos seguintes após sua invenção, tendo o
pico de vendas no ano de 1972. Os cintilógrafos permaneceram em uso graças à
criação de novos radiofármacos que ampliaram seu campo de ação da cintilografia
para outros órgãos além da tireóide, e graças às campanhas de marketing de seus fabricantes.
Houve um longo período de convivência
cintilógrafo/câmeras. Nessa época a maioria dos serviços de Medicina Nuclear
contava simultaneamente com o cintilógrafo, geralmente dedicado à cintilografia
da tireóide e com a câmera de cintilação usada para a cintilografia de outros
órgãos. O uso dos cintilógrafos praticamente cessou nos anos 80, quando foram
definitivamente substituídos pelas câmeras de cintilação.
Em 1991, a Educational and Research Foudation da Society of Nuclear
Medicine recebeu da herança de Mary Cassen, viúva de Benedict Cassem, 1,25
milhões de dólares para instituir o Prêmio Benedict Cassen de 25.000 dólares
anuais, destinado a premiar quem se destacasse na pesquisa em Medicina Nuclear.
A mesma doação foi destinada à criação da Bolsa Benedict Cassen Post-Doutoral
de 25.000 dólares anuais para atrair novos talentos para o setor.
RADIOFÁRMACOS E INÍCIO DA
RADIOFARMÁCIA
Costuma-se dividir a história dos radiofármacos em Fase I – ou Fase
Pré-Tecnécio e Fase II – ou Fase Pós-Tecnécio. A Fase I começou em 14 de junho
de 1945 com um artigo do
Oak Ridge National Laboratories na revista Science anunciando que o Governo dos Estados Unidos punha radionuclídeos
à disposição do setor privado. Essa decisão foi seguida logo depois pelo Brookhaven
National Laboratories. A Fase II,
ou Fase Pós-Tecnécio, começou em 1960, quando foi inventado o gerador de
tecnécio.
Os primeiros radionuclídeos fornecidos pelos reatores e cíclotrons não
cumpriam requisitos necessários para uso humano porque, entre outros fatores
adversos, eles continham impurezas resultantes do processo de bombardeio, não
eram esterilizados e nem estavam livres de agentes pirogênicos. Em 1948, a
Abbott Laboratories decidiu comprar a produção dos radionuclídeos e
transformá-los em radiofármacos, isto é, em medicamentos preparados para uso
humano.
Em 1951, o iodeto de sódio marcado com iodo-131 tornou-se o primeiro
radiofármaco aprovado pela U. S. Food and Drug Administration. Nesse ano a
Abbott construiu uma unidade para a produção do radiofármaco iodeto de sódio
marcado com I-131 e criou um sistema para, no mesmo dia, distribuí-lo por todo
território dos Estados Unidos. O Laboratório Abbott tornou-se a primeira empresa
produtora de radiofármaco no mundo, começando as vendas de radioiodo em 1950.
Em 1951 a Abott vendeu, pela primeira vez, soroalbumina humana (RISA) marcada
com Iodo-131.
Cinco anos depois entraram na Radiofarmácia a Squibb Co. e a Nuclear
Consultants Corporation. Em 1965 os maiores fornecedores eram o Abbott,
Squibb e Mallinkdrodt.
A CINTILOGRAFIA ALÉM DA IMAGEM DA
TIREÓIDE
A invenção do cintilógrafo linear estimulou a obtenção de cintilografias
de outros órgãos e sistemas. Como somente a tireóide e o esqueleto têm a
propriedade natural de acumular seletivamente radionuclídeos, a pesquisa ampliou
o campo de ação da cintilografia, utilizando outros nuclídeos e outras
propriedades de órgãos, tecidos ou sistema para captar eletivamente moléculas,
substâncias ou elementos. As técnicas desenvolvidas para gerar a captação
seletiva de radiofármacos compreenderam os processos baseados na troca iônica,
na troca heteroiônica, na fagocitose, no sequestro celular, na microembolia, em
trocas metabólicas, na secreção de substâncias por órgãos como o fígado e o
rim, nas injeções intravascular, intracavitária e intratumoral, no transporte
linfático, na inalação, nas trocas gasosas, nas reações imunológicas, na
quimioadsorção, e outras.
Inicialmente, o nuclídeo de eleição para marcar substâncias era o
radioiodo, mas também foram usados outros radionuclídeos para o mesmo fim. Em
1965, estavam em uso, entre outros, o ouro-198, o mercúrio-197 e o mercúrio-203
(marcando clomerodrin), o cromo-51 (para marcar cromato), o selênio-75 (para
marcar selenometinonia), o ferro-59 (marcando cromato e citrato), e o
estrôncio-85 (para marcar nitrato).
A tabela a seguir é referente à Fase Pré-Tecnécio dos radiofármacos.
Embora seja incompleta, ela relaciona os dados referentes às principais
substâncias marcadas.
ANO
|
RADIOFÁRMACO
|
AUTOR
|
ÓRGÃO ALVO
|
Inicio dos anos 50
|
Albumina humana 131I
|
Allen ET al.
|
Tumores cerebrais
|
Idem
|
Ouro coloidal 198Au
|
Yuhl et al
|
Fígado (SRE)
|
1953
|
Arsênico 74As -pósitrons
|
Browell &Sweet
|
Tumores cerebrais
|
1955
|
Rosa bengala
|
Taplin et al
|
Vias biliares
|
1958
|
Albumina humana desnaturada pelo
calor 131I
|
Benecerraf et al
|
Fígado (SRE)
|
1968
|
Albumina humana 131I
|
Rejali et al
|
Pool sanguíneo
|
1960
|
Neo-hidrina 293Hg
|
McAfee & Wagner
|
Rim
|
1960
|
Neo-hidrina 203Hg
|
Blau&Bender
|
Cérebro
|
1960
|
Glóbulos vermelhos alterados 51Cr
|
Johnson et al
|
Baço
|
1960
|
Hipuran 131I
|
Tubis ET al
|
Rim – renograma
|
1962
|
seeleniometionina 75 Se
|
Blau & bender
|
Pâncreas
|
1961-1963
|
47Ca 85Sr,18Fl
|
Repectivamene
Corey et al, Fleming et al e Blau et al
|
Esqueleto
|
1963
|
Macro-agregado de albumina humana
|
Taplin et al
|
Pulmão – perfusão
|
A CÂMERA DE CINTILAÇÃO
As cintilografias lineares sofriam de duas principais limitações. A
primeira era imposta pelo movimento mecânico linear do aparelho; a segunda
relacionava-se com o fato de que o registro das radiações estava limitado ao
campo de visão dos colimadores, desperdiçando as radiações emitidas fora da
área de colimação. Essas limitações foram superadas com a invenção da câmera de
cintilação por Hal Anger, quando trabalhava no Donner Laboratory de Berkeley.
Ilustração 3 - Hal Anger
O protótipo da câmera de cintilação era uma “câmera estenopeica” (palavra composta do antepositivo grego stenós que significa estreito e do pós-positivo
grego opsis que significa olho). As
câmeras estenopeicas já eram conhecidas desde os primórdios do estudo da luz e
da fotografia. São câmeras sem lentes nas quais a radiação atravessa um pequeno
buraco (pinhole em inglês) para formar uma imagem invertida no plano oposto à
abertura.
Anger usou no protótipo da câmera de cintilação um colimador pinhole em
cuja base colocou um cristal de iodeto de sódio ativado por tálio com 4
polegadas de diâmetro e 5/6 polegadas de espessura. A imagem da distribuição de
um radiofármaco no protótipo era registrada num filme ou num papel fotográfico
posto em contacto com a superfície externa do cristal que era sensibilizado
pela cintilações. A desvantagem desse primeiro aparelho era o longo tempo
necessário para sensibilizar o filme (pelo menos uma hora), mas tinha a virtude
da registrar a imagem de um órgão por inteiro.
A primeira comunicação do uso in
vivo da câmera de cintilação foi publicada na Revista Nature em 1952,
num artigo ilustrado com a imagem de uma metástase próxima à superfície da pele
e obtida com I-131.
Cabe aqui destacar que, se o cintilógrafo marcou a entrada da imagem na
Medicina Nuclear, a rapidez das imagens obtidas na câmera de cintilação é o
marco da entrada dos estudos dinâmicos em Medicina Nuclear.
Em 1954, Anger fez os primeiros aperfeiçoamentos na câmera e os
apresentou no University of Califórnia Radiation Laboratory em Berkeley CA. O modelo
definitivo do aparelho foi publicado em 1957 no artigo intitulado “A new instrument for mapping gamma-ray
emitters”.
Nessa versão a câmera tinha um
cristal de 4 polegadas sobre o qual estavam acopladas sete válvulas
fotomultiplicadoras, sendo que seis dos tubos estavam dispostos em hexágono e o
sétimo ocupava posição central do conjunto. Nessa disposição das válvulas, a
luz das cintilações de uma radiação gama absorvida era distribuída pelos
diversos tubos e, pela “lógica Anger”
ficava registrada a posição de cada evento no cristal, a partir do qual o
aparelho por um processo analógico criava a imagem cintilográfica.
Ilu stração 4 - esquema da cãmera com colimador pínhole e válvulas
fotomultiplicadoras.
Nos modelos iniciais havia a desvantagem de usar um cristal de pequeno
diâmetro e de pequena espessura com baixa eficiência para a detectar a radiação
gama do iodo-131 (o nuclídeo de uso universal na época) e assim, a câmera só
era usada em exames de pacientes que recebessem doses terapêuticas do
radioisótopo.
Anger publicou novamente seus achados no artigo “Sintilaltion Câmera” na Review of Scintific Instruments em 1958. A
câmera foi apresentada em junho de 1958, na reunião anual da Society of Nuclear
Medicine e, depois, no fim do ano, à reunião da American Medical Association. A
invenção foi patenteada também no ano de 1958.
Em 1962, Anger montou uma câmera com cristal de 11 polegadas.
Ao mesmo tempo em que despertou o interesse de alguns, outros
questionavam a utilidade da câmera. A maioria dos fabricantes de equipamentos
médicos duvidava da viabilidade do produto e de sua utilidade em Medicina
Nuclear, devido à baixa sensibilidade para a radiação γ do I-131, mas John Kurantz, fundador da
Nuclear-Chicago Corp., não teve dúvidas e iniciou a fabricação da câmera. O
primeiro equipamento fabricado tinha um cristal de oito polegadas e 19
fotomultiplicadoras e foi vendido para o Ohio State University Hospital em 1962
para que o médico William Myers que era entusiasta do aparelho (posteriormente
historiador da SNM) o usasse em pesquisas com pequenos animais. Essa câmera
encontra-se hoje no Smithsonian Institution.
Entre os fatores que limitavam o uso da câmera estava a tendência natural
das pessoas resistirem à mudança, o custo do equipamento, a pouca eficiência da
câmera para a radiação γ do iodo-131, além da intensa campanha de marketing dos
fabricantes de cintilógrafos lineares em favor de seus produtos. Uma pesquisa
do Council of American Pathologists em 1973 (15 anos depois da invenção da
câmera) mostrou que a metade dos que responderam à enquete, continuavam a usar
o cintilógrafo embora também possuíssem câmeras de cintilação. Esse panorama
perdurou até os anos 80 quando o uso do tecnécio-99m (cuja meia vida e cuja
radiação γ se ajustavam à câmera) foram os fatores decisivos para a superação
dos cintilógrafos.
Ilustração 5 - cristal e válvula fotomultiplicadoras em uma sonda.
Em 1959, Anger baseado no princípio da detecção por coincidência inventou
uma câmera de pósitrons. Em 1963, Anger e Alexandre Gottschalk, usando o 68
Ga (emissor de +β e com meia-vida de 68 minutos), publicaram o uso
clínico desse aparelho no Journal of Nuclear Medicine num trabalho versando
sobre a localização de tumor cerebral com a câmera de pósitrons. Também com a
câmera de pósitrons, Donald van Dyke, fisiologista e pesquisador, usou o 32Fe
e o 18 F nas pesquisas da cinética do ferro, na determinação do
fluxo sanguíneo e na distribuição medular do ferro em várias doenças.
HISTÓRIA DA SPECT
O acrômio SPECT, composto da iniciais da expressão em inglês: “SinglePhoton
Emission tomography”, foi cunhado em 1978 por Ronald Jack Jaszcszak do
Duke University Medical Center, em Durham.
A invenção da SPECT levou o médico David E Kuhl
e o engenheiro Roy Evans da Universidade da Pensilvânia a distinguirem
a tomografia com raios-X da tomografia com radionuclídeos, classificando a
primeira como tomografia por transmissão e a segunda como tomografia por
emissão.
Ilustração 6 - David E Kuhl
A história da SPECT pode ser sistematizada em quatro momentos: a
tomografia longitudinal, a tomografia transaxial, a tomografia com câmeras
Anger e a tomografia por emissão com anéis estacionários de cristais.
A chegada da imagem
na Medicina Nuclear levou, a exemplo da radiologia, para a busca da tomografia
radioisotópica. Em 1965, Crandall e Cassen inventaram um scanner com detectores
para efetuar tomografia longitudinal por emissão. Em 1969, foi a vez de Anger
que construiu um tomógrafo longitudinal que usava uma câmera de cintilação. Além
dos pesquisadores citados, também Gerd Muehllehner descreveu, em 1970, um tomógrafo
linear por emissão.
Todas as tentativas usaram
os princípios e padeceram das limitações da tomografia longitudinal com
raios-X, mas mesmo assim o scanner tomográfico de Anger foi vendido por vários
anos com o nome de “Pho-Com”, pela Searle
Radiographics.
No início dos anos
1960, o médico David Kuhl, considerado o “pai
da tomografia transaxial” e o engenheiro Roy Edwards iniciaram pesquisas
sobre tomografia longitudinal e tomografia transversal por emissão. Eles foram
os primeiros que criaram tomógrafos transversais para uso com radionuclídeos. O
primeiro aparelho foi construído em 1963 e recebeu a sigla MARK I. Esse
aparelho era formado por dois detectores de cintilação que descreviam um
movimento de translação e rotação em torno da área de interesse. A última
versão do equipamento foi o MARK IV, um aparelho que ainda usava tecnologia
analógica.
Kuhl e colaboradores
começaram usando os tomógrafos para mapear fluxo sanguíneo em cérebros de
animais e para localizar tumores cerebrais e acidentes vasculares em pessoas.
Em 1965, Kuhl realizou o primeiro SPECT de tórax de um paciente.
No fim dos anos 60 e
início da década de 70, o grupo de pesquisadores de John Mallard da
Universidade de Aberdeen criou outra versão de tomografia de emissão que
tornou-se conhecida com o nome de “Aberdeen
Section Scanner”. Esse equipamento foi o primeiro a usar tecnologia digital.
Por alguns anos, o Aberdeen Secton Scannerr foi comercializado pela companhia
J. & P Ltd.
Nessa época, Patten,
Brill e colaboradores também criaram outro tipo de scanner tomográfico que
usava um conjunto de oito detectores e que veio a inspirar a criação do
tomógrafo de detectores múltiplos por Stoddart and Stoddart em 1979.
Em 1965, Paul Harper
e sua equipe da Universidade de Chicago foram os primeiros a usar a câmera de
Anger descrevendo um movimento de rotação em torno do objeto-alvo para realizar
a tomografia transaxial. Em 1968, Gerd Muehllehner mudou o sistema e usou uma
cadeira rotatória colocada frente a uma câmera de cintilação estacionária. A ideia da cadeira rotatória também foi pesquisada por Tom
Budinger, Grant Gullberg and Ron Huesman.
Trabalhando
de forma independente, John Keyes Jr e Ronald J Jaszczak criaram um sistema de SPECT usado uma câmera de
cintilação montada num gantry para rodar em torno de um paciente deitado. Eles
apresentaram seus resultados na reunião da SNM e os publicaram no Journal of
Nuclear Medicine em 1976. A partir daí começaram os aperfeiçoamentos dos
hardwares e dos softwares dos tomógrafos de emissão para a chegada aos modelos
atuais.
No fim dos anos 1970
e durante os anos 1980, Les Rogers e a equipe da Universidade de Michigan
criaram vários tomógrafos usando detectores fixos de NaI(Tl) cuja última versão
(1988) chamou-se SPRINT II. Também em 1988, Genna e Smith da Digital
Scintigraphics Inc. criaram um scanner para SPECT cerebral baseado num anel de
cristais estacionários e um colimador rotativo que recebeu o nome de ASPECT.
Postagens anteriores:
HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES
NO DIAGNÓSTICO MÉDICO –
ONDAS DE CHOQUE - RUÍDO
E SOM - PERCUSSÃO E AUSCULTA.
HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES
NO DIAGNOSTICO MÉDICO = ONDAS DE CHOQUE - PULSO E PRESSÃO ARTERIAL.
HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES
NO DIAGNÓSTICO MÉDICO – ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO = RAIOS X
HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES
NO DIAGNÓSTICO MÉDICO – ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO
A HISTÓRIA DAS RADIAÇÕES NO DIAGNÓSTICO MÉDICO
- AS PRIMEIRAS RADIOGRAFIAS, A CHEGADA DOS RAIOS X NO BRASIL - OS RAIOS X NAS
GUERRAS - A HISTÓRIA DA EVOLUÇÃO DOS TUBOS DE RAIOS X - A HISTÓRIA DA
FLUOROSCOPIA - A HISTÓRIA DA ABREUGRAFIA
A HISTÓRIA DOS FILMES RADIOGRÁFICOS
A HISTÓRIA DOS ÉCRANS REFORÇADORES
A HISTÓRIA DO DIAFRAGMA POTTER-BUCKY
A HISTÓRIA DOS MEIOS DE CONTRASTE EM
RADIOLOGIA
A HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA CONVENCIONAL – A
HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
MEDICINA NUCLEAR – PRIMEIRA PARTE = INTRODUÇÃO =
CLASSIFICAÇÕES DOS ELEMENTOS= CLASSIFICAÇÕES DOS NUCLÍDEOS
A HISTÓRIA DA MEDICINA
NUCLEAR – A DESCOBERTA DA RADIOATIVIDADE = BECQUEREL = MARIE E PIERRE
CURIE
A HISTÓRIA DA MEDICINA
NUCLEAR– A NATUREZA DAS RADIAÇÕES α, β e γ
A HISTÓRIA DA MEDICINA
NUCLEAR– O CONCEITO DE RADIOTRAÇADOR
A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR - OS DETECTORES NA FASE DE 1896 A 1936
A HISTÓRIA DA MEDICINA
NUCLEAR– HEVESY E O CONCEITO DE RADIOTRAÇADOR = A EXPERIÊNCIA DE BLUMGART = A
TERAPIA COM RADIOISÓTOPOS NATURAIS
A HISTÓRIA DA MEDICINA NUCLEAR- A
TERPIA COM ISÓTOPOS ARTIFICIAIS- A MEDICINA ATÔMICA E A MEDICINA NUCLEAR – OS
ISÓTOPOS DO IODO- OS DETECTORES ELETRÔNICOS DE CINTILAÇÃO
Próxima postagem:
O RADIOIMUNOENSAIO – O GERDOR DE
TECNPECIO
Muito interessante, Dr Irion!!
ResponderExcluir